Já gastamos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não basta
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastamos tudo menos o silêncio.
Gastamos os olhos com o sal das lágrimas,
gastamos as mão à força de as apertarmos,
gastamos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.
(...)
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
(...)
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
(...)
Já gastamos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Eugénio de Andrade
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