sexta-feira, outubro 13, 2006

Metade - Osvaldo Montenegro

METADE
Que a força do medo que eu tenho, não me impeça de ver o que anseio. Que a morte de tudo o que acredito não me tape os ouvidos e a boca Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio... Que a música que eu ouço ao longe, seja linda, ainda que tristeza... Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada mesmo que distante Porque metade de mim é partida mas a outra metade é saudade... Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece, e nem repetidas com fervor, apenas respeitadas, como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos Porque metade de mim é o que ouço, mas a outra metade é o que calo... Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço E que essa tensão que me corroe por dentro seja um dia recompensada Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão... Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso, que me lembro ter dado na infância Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade eu não sei... Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para me fazer aquietar o espírito. E que o teu silêncio me fale cada vez mais... Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço... Que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba E que ninguém a tente complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer Porque metade de mim é platéia, e a outra metade é canção... E que a minha loucura seja perdoada, Porque metade de mim é amor, e a outra metade... também... (Oswaldo Montenegro)

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